Publicação científica trimestral do CREMERJ - volume 2 - número 2 - 2023

27 Med. Ciên. e Arte , Rio de Janeiro, v.2, n.2, p.25-41, abr-jun 2023 Hepatite alcoólica Bernardo da Cruz Junger de Carvalho et al. global provavelmente está aumentando, es- pecialmente entre adultos jovens (na faixa dos 20 e 30 anos) e mulheres. (5,6) Houve aumento da incidência durante a pandemia da Covid-19. (7,8) Um levantamento em larga escala com biópsias sistemáticas em 1.604 pacientes alcoólicos, sintomáticos ou não, mostrou que a prevalência de HA era de 20%. (9) A idade típica de apresentação da síndrome é de 40 a 60 anos. A HA é uma causa frequente de des- compensação hepática. Numa coorte com 250 doentes, observou-se HAG histologi- camente comprovada em 25% dos doentes que desenvolveram “Acute on chronic liver failure” (ACLF) – insuficiência hepática aguda-sobre-crônica – durante a hospi- talização. (10) A ACLF é uma síndrome caracterizada por disfunções orgânicas (hepáticas e/ou extra-hepáticas) e alta mortalidade no curto prazo e que ocorre frequentemente no con- texto da cirrose alcoólica. Atualmente esse conceito trouxe novo enfoque ao tratamento dos pacientes com hepatite alcoólica. AHA grave foi sugerida como um evento precipitante para ACLF, porque os estudos evidenciaram que o consumo ativo de álcool nos últimos 3 meses está presente em 20% dos pacientes com ACLF. Em pacientes hospitalizados com cir- rose e descompensação aguda, a infecção bacteriana foi identificada como o fator precipitante mais comum da ACLF. Sabe-se que o consumo de álcool também aumenta o risco de infecção através de diversos me- canismos: imunidades inata e adaptativa prejudicadas; supercrescimento bacteriano; disbiose; translocação de bactérias e pro- dutos bacterianos intestinais. (11) FISIOPATOLOGIA O álcool é metabolizado no hepatócito em acetaldeído, que promove maior afluxo de ácidos graxos no fígado, maior síntese hepática de ácidos graxos e redução da oxidação e da exportação de gordura do fígado. Tudo isso leva à esteatose hepática. O acetaldeído também provoca estresse oxidativo, lesão mitocondrial e apoptose de hepatócitos. O etanol promove ainda a translocação de lipopolissacarídeos (LPS) do lúmen in- testinal para a veia porta e o fígado – isso através do aumento da permeabilidade intestinal, supercrescimento bacteriano e ação inibitória sobre o sistema reticuloen- dotelial. Esses LPS ligam-se às células de Kuppfer com a liberação de múltiplas cito- cinas, resultando num recrutamento maciço de células inflamatórias, observado na HA, com grande lesão hepatocitária. Trata-se de um estado inflamatório intenso que corresponde a uma síndrome de resposta inflamatória sistêmica e explica o quadro clínico da HA. Ocorre também estímulo das células estreladas, que quando ativa- das se transformam em miofibroblastos, produtores de colágeno do tipo 1 e outras

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