Publicação científica trimestral do CREMERJ - volume 2 - número 2 - 2023

56 Heterogeneidade da Síndrome de Sjögren: Estado da arte para a prática clínica Mirhelen Mendes de Abreu Med. Ciên. e Arte , Rio de Janeiro, v.2, n.2, p.55-76, abr-jun 2023 desses sintomas poderia ser uma entidade distinta e começou a descrever pacientes sob um diagnóstico “guarda-chuva” de ce- ratoconjuntivite seca. Avaliações criteriosas e prospectivas foram realizadas, contendo anotações clínicas e microscópicas. Em 1933, Henrik Sjögren descreveu a evolução de 19 pacientes, defendendo a tese de que haveria uma nova condição clínica a ser descrita, a qual denominou por “Cerato- conjuntivite Seca”. (2) A tese foi recebida com grande entusiasmo, mas também foi frontalmente criticada por seus opositores, o que acarretou o encerramento das ativi- dades acadêmicas de Henrik Sjögren. No entanto, ele continuou sua atividade clínica e foi parar em Jönköping, uma cidade no sul da Suécia, em 1935. A despeito de todas as críticas à sua tese, Henrik Sjögren ganhou notoriedade internacional, que começou com a tradu- ção, em 1943, de sua tese para o inglês por um oftalmologista australiano, Bruce Hamilton, e o subsequente convite para se tornar professor convidado no Royal Australian College of Opthalmologists. Este passeio pela Austrália foi parte de uma rota que o levou ao redor do mundo. Henrik Sjögren foi um grande clínico, com ampla atividade assistencial. Como reco- nhecimento de seu trabalho e reputação internacional, ele foi agraciado com o título de professor associado pela Universidade de Gotemburgo em 1957. Em 1961, o gover- no sueco concedeu-lhe o merecido título de "professor". INTRODUÇÃO Síndrome de Sjögren (SS) é um trans- torno multissistêmico e heterogêneo em sua apresentação, curso e desfecho. (1) Caracte- riza-se pela presença de lesões imunome- diadas em glândulas lacrimais, levando ao ressecamento da boca (xerostomia) e dos olhos (xeroftalmia). O distúrbio glan- dular e subsequente ressecamento pode afetar outras superfícies mucosas, como vias aéreas, aparelho digestivo e vagina, resultando no quadro clínico conhecido como " síndrome sicca ". Por sua natureza sistêmica, a SS acarreta manifestações clínicas extremamente pleomórficas. Em relação ao impacto da SS na qualidade de vida, a doença afeta negativamente a ati- vidade diária do paciente em razão da alta prevalência de fadiga, depressão, ansiedade e diminuição da performance física. SS é definida como "primária" se não estiver associada a outras doenças, ou "secundária" se ocorrer em associação com uma doença autoimune subjacente do tecido conjunti- vo, como artrite reumatoide (AR), lúpus eritematoso sistêmico (LES) ou esclerose sistêmica (ES). HISTÓRICO SS recebeu esse nome em homenagem ao oftalmologista sueco Henrik Sjögren (1899-1986). (2) Em 1929, Dr. Sjögren des- creveu o caso de um paciente que se quei- xava de olhos secos, ressecamento oral e poliartralgia. Ele notou que a combinação

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