
PARECER CREMERJ nº 05/2021
PROCESSO PARECER CONSULTA Nº 17/2019
INTERESSADO: Unimed São Gonçalo-Niterói do Leste Fluminense (Protocolo nº: 10298807)
ASSUNTO: Prescrição de atendimento a pacientes portadores de Transtorno do Espectro Autista e se estaria fora do Ato Médico e das indicações de atendimento
RELATOR: Conselheiro Guilherme Toledo
EMENTA: Questionamento sobre violação de normas do CFM/CRMs em caso de indicação de atendimento a pacientes portadores de Transtorno do Espectro do Autismo (TEA) por profissionais não médicos e definição de técnicas/métodos a serem empregados por eles. Sendo comprovada a importância do cuidado multidisciplinar no tratamento de Transtornos do Espectro Autista (TEA), é atribuição médica a prescrição e o encaminhamento de pacientes aos profissionais não-médicos com formação adequada para atendimento dos quadros de TEA.
DA CONSULTA
A Unimed São Gonçalo-Niterói do Leste Fluminense relata ter sido surpreendida com o recebimento de solicitações médicas, pleiteando a cobertura de atendimento de métodos terapêuticos específicos não médicos, através da fisioterapia, psicologia, fonoaudiologia e terapia ocupacional e, por vezes, com certificações específicas para o acompanhamento de pacientes portadores/sofredores de Transtorno do Espectro Autista.
Na PRESCRIÇÃO 1 foram descritas várias especialidades com respectivos certificados abaixo relacionados:
1 - Certificação em Psicologia com especialização em ABA (Applied Behavier Analysis), sendo o paciente acompanhado por um psicólogo especializado e acompanhado pelo método específico da BACC (Behavior Analyst Certification Board).
2 - Certificado em Fonoaudiologia com especialização em PECS (Picture Exchange Comunication System) e TECCH (Tratamento e Educação para Autistas e Crianças com Déficits Relacionados). Devido às alterações verbais e não verbais seria indispensável o acompanhamento de fonoaudiólogos, com a referida especialização, para melhoria do sistema de comunicação do paciente.
3 - Certificação em Terapia Ocupacional, com especialização em integração sensorial e supervisão em ABA, onde o paciente apresentaria desordem sensorial, com dificuldade de modular e discriminar as sensações de maneira adaptativa com o mundo externo. Necessitando de Terapeuta Ocupacional com tal especialidade de integração sensorial.
4 - Certificado de Psicomotricidade em ABA.
Sendo feita uma SEGUNDA PRESCRIÇÃO com indicação de urgência, no período de 20 (vinte) a 40 (quarenta) horas semanais, para o tratamento de uma criança portadora do Transtorno do Espectro Autista, com as referidas especialidades não médicas acima citadas, para acompanhamento do caso.
Desta forma, poderia o Médico Assistente prescrever e limitar um tipo de terapia e método a ser utilizado no tratamento do paciente Portador do Transtorno do Espectro Autista?
DO PARECER
Em pesquisa, a Portaria do Ministério da Saúde nº 324, de 31 de março de 2016, que “Aprova o Protocolo Clínico das Diretrizes Terapêuticas do Comportamento Agressivo do Espectro do Autismo”(BRASIL,2016), se refere a um protocolo com diretrizes clínicas baseadas em evidências da pessoa com TEA (Transtorno do Espectro Autista) para melhoria de seu convívio familiar, escolar e social. Há indicação de uso de intervenção farmacológica com uso da Risperidona, sendo um medicamento incorporado ao Sistema Único de Saúde (SUS), e devendo ser utilizado nas três esferas de governo (Federal, Estadual e Municipal), com bula aprovada pela Vigilância Sanitária.
O Autismo, como transtorno neuropsiquiátrico crônico, que se desenvolve na primeira infância, agora referido como Transtorno do Espectro Autista e que anteriormente era distinto do Autismo e Síndrome de Asperger, sendo transtornos mentais associados a um prejuízo mental funcional do sujeito, com perda da interação social grave e de comunicação, comportamentos repetitivos de interesse restrito, iniciando geralmente no terceiro ano de vida e mais comum no gênero masculino; com distúrbio no convívio familiar e social; perturbação na sua educação e necessidades de intervenções terapêuticas devido a irritabilidade, reações hostis e agressivas, e comorbidades como ansiedade e Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH); com prevalência populacional de 1 a 2% na população. Cerca de 50% de crianças de até 7 anos de idade com diagnóstico de autismo apresentam episódios de auto agressão e 15% com hospitalizações e piores prognósticos.
Na nova Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados à Saúde, a CID-11, temos o Autismo Infantil, Autismo Atípico, Transtorno Desintegrativo da Infância, Síndrome de Asperger e outros transtornos invasivos do desenvolvimento. Porém, seu diagnóstico é iminentemente clínico, onde observa-se que o espectro autista é sinônimo de continuidade, com maior ou menor do grau de comprometimento da comunicação verbal e não verbal, nível de comprometimento do desenvolvimento da criança não incompatíveis, e sim complementares aos sintomas. No entanto, deve-se ter em conta a comunicação verbal e não verbal, quociente intelectual (QI), com extensão do campo de interesse e o contexto familiar e social. Ressalta-se que o diagnóstico é do psiquiatra, dentro do Ato Médico, porém com o apoio de uma equipe multidisciplinar, se considerando diagnósticos diferenciais e comorbidades em que o retardo mental precisa ser bem avaliado, além das depressões e transtornos obsessivos compulsivos e da própria esquizofrenia infantil.
Num instrumento de avaliação do ano de 2000, numa versão reduzida do Behavior Problem Inventory, temos 3 (três) escalas (leve, moderada e grave), que traduzem bem o espectro autista nas suas auto e hetero agressões, como irritabilidade, letargia, comportamento esteriotipado, hiperatividade e fala inapropriada, de forma progressiva de agravamento dos casos.
No seu tratamento se buscaria habilitá-las à participação em atividades comportamentais, educacionais e sociais. O tratamento não medicamentoso se basearia em intervenções comportamentais e educacionais para melhoria do prognóstico da pessoa com TEA, com equipe multidisciplinar com aplicação da ABA (Appleid Behavior Analysis), envolvendo escola, família e comunidade, ampliando ao máximo os cuidados devido a gravidade dos casos do TEA.
No tratamento medicamentoso são orientados os psicofármacos antipsicóticos do tipo neurolépticos típicos (haloperidol) e atípicos (risperidona), que agem como antagonistas dos receptores da dopamina e serotonina, que são neurotransmissores cerebrais, regulando a ansiedade e comportamentos agressivos. Assim, deve ser associado o tratamento não médico executado por uma equipe multidisciplinar comportamental ao tratamento médico psiquiátrico com uso de psicofármacos, como referido no parecer em tela.
O prognóstico da doença é ruim e não tem cura, porém as terapias de intervenção precoces podem obter ganhos significativos no desenvolvimento neuropsicomotor da criança, melhorando a neuroplasticidade e potencial de mielinização da mesma. Acreditamos que daí tenha vindo a prescrição complementar visando ao tratamento precoce e intenso do TEA proposto no caso.
Desta forma podemos esclarecer que o tratamento psiquiátrico com ajuda dos psicotrópicos tem seu valor terapêutico nos casos mais graves do TEA, e que seu acompanhamento não médico acima citado auxilia de maneira efetiva nos casos precoces de Autismo e em todo processo do desenvolvimento emocional/mental dos mesmos.
CONCLUSÃO
Podemos concluir, portanto, conforme parecer da Câmara Técnica de Psiquiatria e Saúde Mental, que não podemos interferir no método a ser utilizado pelos não médicos em tela, mas podemos e devemos, dentro do Ato Médico, determinar os profissionais a serem empregados no tratamento do TEA, com formação adequada para o atendimento dos quadros de Autismo e, desta forma, orientar e prescrever a indicação dos profissionais não médicos, onde já ficou comprovada a grande ajuda terapêutica para o tratamento e desenvolvimento psicomotor na melhoria dos casos.
Este é o parecer, S. M. J.
Rio de Janeiro, 04 de fevereiro de 2021
Guilherme Toledo
Conselheiro Relator
Parecer aprovado na 294ª Sessão Plenária do Corpo de Conselheiros do CREMERJ, realizada em 04 de fevereiro de 2021.
ReferEncia:
BRASIL. Ministério da Saúde. Portaria Nº 324, de 31 de março de 2016. Aprova o Protocolo Clínico e Diretrizes Terapêuticas do Comportamento Agressivo como Transtorno do Espectro do Autismo. Diário Oficial da União, Seção. I, p.1 105, 01 abr. 2016. Disponível em: http://portalarquivos2.saude.gov.br/images/pdf/2016/abril/01/Portaria-324-de-31-de-mar--o-de-2016.pdf Acesso em 14 de ago. de 2020.
ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DA SAÚDE. CID-11 Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados à Saúde. 11 ed. [s.l]: OMS, 2020.
Não existem anexos para esta legislação.
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