Publicação científica trimestral do CREMERJ - volume 2 - número 1 - 2023

43 Med. Ciên. e Arte , Rio de Janeiro, v.2, n.1, p.42-60, jan-mar 2023 Abordagem clínica nas lombalgias: uma revisão narrativa Mirhelen Mendes de Abreu dependentes do contexto, de elementos cog- nitivos e comportamentais. Esta distinção explica em parte a fraca correlação com a patologia e os sintomas, e o porquê de as intervenções que não têm efeito sobre processos degenerativos (p. ex., terapias psicológicas ou acupuntura) podem ter efeitos profundos sobre a dor e qualidade de vida, enquanto intervenções que abordam patologia (p. ex., cirurgia) algumas vezes não fornecem benefício. (1,2) Esta noção foi eloquentemente descrita por Melzack e Casey (3) em sua classificação histórica da dor em: sensorial-discrimina- tivo, afetivo-motivacional e cognitivo-com- ponentes avaliativos. Constitui a base para uma abordagem multimodal de medicina de precisão para a lombalgia, e é uma base para o modelo biopsicossocial. Nesta revisão, fornecemos uma breve visão geral sobre epidemiologia e as causas e fatores de risco que contribuem para a patogênese da lombalgia. Na sequência, apresentamos os aspectos clínicos e racio- cínio diagnóstico e as diferentes opções te- rapêuticas, com enfoque para as estratégias não medicamentosas e medicamentosas. Optamos por não abordar intervenções cirúrgicas neste material. EPIDEMIOLOGIA Um estudo realizado em 195 países que avaliou a incidência, prevalência e anos vividos com incapacidade para 354 condi- ções médicas descobriu que a lombalgia é a INTRODUÇÃO Lombalgia abrange um espectro de diferentes tipos de dor, incluindo dor no- ciceptiva, dor neuropática (radicular) que percorre as pernas e, em alguns casos, dor nociplásica, que é causada pela amplifi- cação da dor no sistema nervoso central (SNC), muitas vezes se inserindo sob o guarda-chuva de lombalgia inespecífica. (1) Frequentemente, esses subtipos de dor se sobrepõem. Por exemplo, um paciente com hérnia de disco que tem dor nas costas pode ter dor radicular e sintomas difusos fora dos padrões de referência patoanatômica. A região lombar é anatomicamente defi- nida como extensão da 12ª costela à crista ilíaca, e embora a dor lombar muitas vezes coexista e seja confundida com a dor na nádega, a região das nádegas é anatomi- camente distinta e compreende uma região da crista ilíaca até as pregas glúteas. A maioria das pessoas tem pelo menos um episódio de lombalgia em sua vida. Esta condição é geralmente autolimitada, mas muitas vezes se torna crônica. (1) A cronificação da lombalgia é um de- safio na prática clínica e se constitui um problema de saúde pública, tendo em vista o seu impacto na produtividade do indivíduo e os prejuízos laborais. Lombalgia é uma consequência de interações complexas, abrangendo fatores biológicos, psicológi- cos e sociais. É importante entender que a dor é distinta da nocicepção, e inclui não apenas uma fibra delta e ativação da fibra C, mas também fatores emocionais que são

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