BIOÉTICA E MEDICINA

determinou uma “guinada pragmática em ética”, deslocando os debates filosóficos da meta-ética para a ética aplicada. Abioética nasceu em dois lugares: emMadison, Wisconsin e emWashington. Quem cunhou o neologismo “bioética“ foi o médico oncologista Van Rensselaer Potter, da Universidade de Wisconsin, em artigo publicado em 1970, intitulado “Bioethics, the science of survival.” Para Potter, impunha-se a necessidade de desenvolver um entendimento realista do conhecimento biológico e seus limites, a fim de fazer recomendações no campo das políticas públicas. Para isso, seria necessário estabelecer uma “ponte” entre ciências biológicas e valores morais, em vista de fundar uma nova ética baseada no escopo da sobrevivência humana num ambiente saudável. Alguns meses após Potter haver introduzido o novo termo, alguns estudiosos da Georgetown University, tendo o médico obstetra, fisiologista fetal e demógrafo André Hellegers à frente, utilizavam o mesmo neologismo só que com um sentido diferente. Para estes, a bioética seria um campo interdisciplinar da própria filosofia moral (e não entre ciência e filosofia, como era para Potter), que deveria tratar de dilemas biomédicos concretos restritos a três áreas: a) os direitos e os deveres do paciente e dos profissionais da saúde; b) os direitos e os deveres na pesquisa envolvendo seres humanos; e c) a formulação de diretrizes para a política pública, o cuidadomédico e a pesquisa biomédica. As questões emergentes, rotuladas pelo Instituto Kennedy como dilemas bioéticos, estavam na pauta do dia de governantes e da opinião pública nesse período. Criou-se, assim, um ambiente cultural que permitiu, pela primeira vez, a introdução de bioeticistas, não médicos, nas decisões da prática biomédica que, até então, era território exclusivo dos médicos e, emalguns casos, de religiosos. Dessa forma, os bioeticistas assumiram para si a tarefa de deslocar a ética médica, essencialmente deontológica e embasada na tradição milenar hipocrática, para o campo secular dos conflitos vigentes em sociedades democráticas e plurais. Representava uma tarefa urgente e difícil, uma vez que os dilemas éticos estavam a necessitar de respostas imediatas e a ética médica, no início dos anos 70, não era individualizada como um campo verdadeiramente disciplinar, uma vez que se tratava de uma mistura de religião, de idéias curiosas, de discursos exortativos, de 22

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