PRÊMIO DE RESIDÊNCIA MÉDICA

192 193 Prêmio de Residência Médica Prêmio de Residência Médica INTRODUÇÃO O câncer colorretal (CCR), neoplasiamalignamais comum do tubo digestivo, teve um aumento em sua incidência, principalmente nos países em desenvolvimento, que são considerados como áreas de baixo risco1. Segundo estimativas do Instituto Nacional do Câncer (INCA), são esperados para o ano de 2011 no Brasil cerca de 28.000 novos casos de câncer colorretal, correspondendo a 13.000 no sexo masculino e 15.000paraosexo feminino2. Aproximadamente 80% dos pacientes desenvolvem o câncer colorretal de forma esporádica, e em 20% existe suscetibilidade genética envolvida1. Dentre as formas hereditárias, o câncer colorretal hereditário não polipose (CCNHP) é o mais comum, responsável por 3% a 5% de todos os cânceres colorretais 3 . O câncer colorretal hereditário não polipose (CCHNP), comumente referido como Síndrome de Lynch, é uma doença autossômica dominante de predisposição a neoplasias, com penetrância de 80%3, decorrente de mutação germinativa em um dos genes de reparo de DNA (mismatch repair – MMR) - hMLH1, hMSH2, hMSH6 e PMS24. A síndrome é caracterizada por maior suscetibilidade a câncer colorretal (Síndrome de Lynch 1) e outros tumores extracolônicos, tais como de ovário, endométrio, mama, gástrico, pancreático, ureterais e da pelve renal (Lynch 2) 5 . BASES GENÉTICAS A síndrome de Lynch, como dito anteriormente, é uma doença autossômica dominante, causada por mutações nos genes de reparo do emparelhamento de bases do DNA, pertencentes à classe MMR (mismatch repair). A identificação inicial da base genética da síndrome começou na década de 1990 a partir da localização dos genes hMLH1 e hMLH2 6 . Desde então, quatro genes MMR tem sido claramente ligados ao desenvolvimento da doença: hMLH1 (cromossomo 3p21-3), hMSH2 (2p22-p21), hMSH6 (2p16) e hPMS2 (7p22) 3,7 . Combinadas, as mutações nos genes hMHL1 e hMHS2 são responsáveis por 80 a 90% dos casos da doença, enquanto as mutações nos genes hMSH6 contribuem para 10%, e no gene hPMS2 para cerca de 5% 4 . A maioria das mutações observadas em genes MMR são do tipo frameshift ou nonsense, resultando em produtos proteicos truncados8. Técnicas tradicionais de análise podem falhar na identificação de outras mutações de perda de função: mutações missense ocorrem em 30% das vezes, particularmente nos genes hMLH1 e hMSH6, e podem causar deficiências funcionais que não são detectadas através de imunohistoquímica8,9. Assim, podem ser necessários métodos mais rebuscados de análise para identificar todo o espectro das mutações. Defeitos nos genes MMR levam aos achados característicos de instabilidade microssatélite (MSI), comumente identificadas pela testagem de cinco pontos chave para erros de replicação microssatélite 4,10 . Alterações nas sequências de microssatélites levam a mutações dos genes que atuam na regulação do crescimento celular. O gene codificador do TGF- (fator de transformação de crescimento ) contém um microssatélite suscetível a mutação em caso de MSI. Mutações nesse gene inativam o receptor TGF- , que inibe o crescimento de células epiteliais intestinais normais. A MSI também determina mutações no gene BAX, que é um importante promotor de apoptose celular 3,11 , acelerando a sequência adenoma-carcinoma. Instabilidade microssatélite de alta frequência – MSI-H (high) – caracterizada por duas ou mais sequências de microssatélites mutadas, é detectada em mais de 90% 10 dos tumores colorretais da síndrome de Lynch. Reciprocamente, a ausência de produtos proteicos dos genesMMRna imunohistoquímica tem valor preditivo próximo a 100% 12 para MSI-H. A instabilidade microssatélite de alta frequência também é identificada em 15 a 20% dos CCR esporádicos. Na maior parte desses casos, os achados resultam da hipermetilação do promotor do gene hMLH1 causada por mutações no gene BRAF 13 . Defeitos genéticos específicos são reconhecidos como predisponentes para diferentes expressões fenotípicas. Mutações no gene hMSH2 são associadas com a variante fenotípica de Muir- Torres, na qual o CCHNP é acompanhado de múltiplos adenomas sebáceos cutâneos, carcinomas sebáceos e ceratoacantomas 10 . Mutações no gene hMHL1 e hPMS2 podem ser ligadas à síndrome de Turcot, uma associação de CCHNP com tumores cerebrais 14 . Mutações no hMSH6 estão envolvidas com taxas mais altas de câncer de endométrio, porém com taxas mais baixas de CCR. Homozigose para hMLH1 e hMSH2 ou heterozigosidade composta podem produzir alterações atípicas, tais como neoplasias hematológicas e neurofibromatose 4 . APRESENTAÇÃO CLÍNICA E DIAGNÓSTICO A apresentação clínica é heterogênea, mas a síndrome é geralmente caracterizada por câncer colorretal com idade de início precoce (média de 45 anos), com predominância das lesões situadas no cólon direito, sendo 70% delas localizadas próximas à flexura hepática, com aumentado número de tumores sincrônicos emetacrônicos. Há predominância de adenocarcinomas mucinosos e pouco diferenciados, além de espectro único de tumores extracolônicos tanto benignos quanto malignos 7,15 .Câncerdeendométrioocorreem43%, câncer gástrico em 19%, câncer do trato urinário em 18% e câncer de ovário em 9% dos indivíduos afetados. As neoplasias extracolônicas são mais prevalentes nas mulheres, uma vez que nelas o risco de desenvolver câncer de endométrio é maior que o risco de desenvolver câncer colorretal. O risco cumulativo de desenvolvimento de qualquer neoplasia aos 70 anos é de aproximadamente 90% nos homens e 70% nas mulheres afetadas 4 . Duas síndromes foram inicialmente descritas. A síndrome de Lynch I, caracterizada pelo câncer de cólon em indivíduos relativamente jovens, e a síndrome de Lynch II, caracterizada por famílias sob risco de câncer colorretal e extracolônicos, como os cânceres de ovário, endométrio, gástrico, pancreático, ureterais e da pelve renal 16 . O diagnóstico da síndrome de Lynch requer a averiguação de uma história familiar precisa e detalhada, além do conhecimento da doença e de suas características por parte do médico, que pode estar diante do primeiro caso dentro de uma família. Todavia, é importante reconhecer que embora a história familiar do câncer colorretal auxilie quando presente, a sua ausência não exclui a síndrome de Lynch 15 . A história familiar tem sido a principal forma de identificação de pacientes sob risco de desenvolver a síndrome, já que não há sinais ou sintomas clínicos que sejam capazes de predizer tal suscetibilidade. Foram criados, então, pelo Grupo Colaborativo Internacional (GCI), os critérios de Amsterdam, em 1990, para que famílias suscetíveis fossem identificadas. Por serem altamente restritivos, os critérios de Amsterdam foram expandidos, incluindo outros tumores relacionados à síndrome de Lynch (colorretal, endometrial, de intestino delgado, gástrico, pancreático, ureteral e de pelve renal), dando origem aos critérios de Amsterdam modificados (tabela 1) 3 . A introdução dos critérios de Bethesda (ver tabela 2), criados em 1997 pelo Instituto Nacional de Câncer (NCI) americano, durante conferência de consenso, e posteriormente revisados, levou a uma liberalização adicional na identificação desses pacientes. Os critérios de Bethesda foram estabelecidos de modo que identifiquem indivíduos e famílias nos quais a Síndrome de Lynch é suspeita e para quem a testagem da instabilidade microsatélite estaria indicada. Foi proposto, na conferência, que fossem analisados cinco marcadores de microssatélite para detecção de MSI na Síndrome de Lynch: BAT25, BAT26, D5S346, D2S123 e D17S250 4,16 . Em 2002, foram revisados e ampliados os critérios originais e, em 2004, foram novamente revistos, passando a incluir os achados da síndrome de Muir-Torres. Embora a sensibilidade dos critérios de Bethesda seja maior que a dos critérios de Amsterdam, ambos apresentam falhas quanto à sensibilidade e à especificidade para o diagnóstico da doença 17 .

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