PRÊMIO DE RESIDÊNCIA MÉDICA

214 215 Prêmio de Residência Médica Prêmio de Residência Médica dessas medidas comportamentais, diversos tratamentos tópicos são descritos na literatura como terapia compressiva (bota de Unna e curativos compressivos) 4 . Porém, é importante ressaltar que o tratamento de compressão, em forma de meias elásticas ou faixas - considerado como a primeira linha de tratamento para ulceração venosa - é contraindicado na presença de doença arterial clinicamente importante 5 . Além dos tratamentos compressivos, há descrição literária de tratamentos locais. O desbridamento, fre- quentemente realizado, pode ser autolítico com curativos hidrogéis e hidrocoloides, químico com enzimas como papaína e colagenase ou mecânico. Porém, tra- ta-se de uma técnica não seletiva que remove o tecido viável juntamente com os desvitalizados. Além disso, não há evidência de sua efetividade em estudos con- trolados e randomizados 2 . Além disso, as opções de curativos com hidrogel e hidrocolóide apresentam alto custo 6 . Por conta disso, muitos outros tratamentos tópicos têm sido utilizados na prática clínica, entre eles, a aplicação do ácido tricloroacético. Em nossa prática clínica, observamos a cicatrização de úlceras crônicas multifatoriais com a aplicação tópica do ácido tricloroacético (ATA). Esse ácido vem sendo utilizado para tratamento de outras afecções dermatológicas como cicatrizes de acne 7 , verrugas de HPV, rejuvenescimento facial, tratamento de fotodanos e de lesões pré-malignas como ceratose actínica, não sendo ainda descrito na literatura o seu uso em úlceras crônicas. O caso em questão demonstra a aplicabilidade do ATA no tratamento de úlceras crônicas e o resulta- do obtido, bem como vantagens desse método, entre as quais, destacamos: o baixo custo comparado aos curativos biológicos, à facilidade da aplicação e os poucos efeitos adversos (restritos basicamente à dor em queimação de caráter transitório). Além disso, ob- servamos em nossa prática que a aplicação do ácido contribui para prevenir infecção e reduzir a dor crónica da úlcera. CASO CLÍNICO JFS, 62 anos, masculino, morador de Realengo, comerciante, cadeirante há cinco anos refere dor em úlcera no maléolo medial do membro inferior esquer- do de caráter crônico e progressivo desde o surgimen- to da úlcera em 2004. Relata que a mesma já havia cicatrizado em 2007 durante internação hospitalar por três meses. Após alta hospitalar, a úlcera ressur- giu maior e com bordas hipertróficas que aumenta- ram progressivamente. Tratamentos prévios: uso de sulfadiazina de prata nas trocas de curativo diárias realizada pelo próprio paciente desde 2007 com uso irregular de dipirona para controle da dor, sem melhora da úlcera. Apresentava como comorbidades: hipertensão arterial, diabetes mellitus tipo II e psoríase em uso de metotrexate. De história patológica pregressa, refere fratura de fêmur esquerdo em 2007 aguardando troca de prótese com uso de cadeira de rodas desde então. Além disso, apresenta sequela mo- tora de AVC ocorrido em 1994 com acometimento do dimídio esquerdo e força grau IV em perna esquerda. Na história social, refere ser ex- etilista e ex-tabagista. Ao exame, úlcera de 12cm em diâmetro transversal por 8,5cm no diâmetro longitudinal, abrangendo face anterior e medial de terço inferior do membro inferior esquerdo (Fig. 1). As bordas eram hipertróficas com aspecto queloideano e o fundo da úlcera apresentava fibrina e exsudato amarelado. Fig 1 - Aspecto da úlcera antes do tratamento: notar fundo com fibrina e bordas queloidianas. Fig 2 - Frosting da lesão: grau 3 - frosting uniforme após aplicação de TCA. Fig 3 - Aspecto da úlcera após 20 dias de aplicações diárias de TCA: notar superficialização e tecido de granulação. Durante internação, iniciamos o tratamento da dor com tramadol 100 mg EV à noite e dipirona 500gVO8/8h.Oácido tricloroacético foi utilizado na concentração de 90% como monoterapia tópica, sendo aplicado até o surgimento de frosting uniforme sobre a lesão (Fig. 2). A desnatu- ração proteica provocada pelo ATA é clinicamente evidenciada pela formação do frosting (branqueamento) e alteração do turgor cutâneo. Esses dois elementos servem como parâmetros clínicos naavaliaçãodaprofundidade do peeling de ATA. Quanto à intensidade do frosting: 1) Superficial ou epidérmico – eritema difuso com branqueamento leve; 2) Médio ou derme superficial – branqueamento moderado e uniforme e 3) Profundo – branqueamento intenso e uniforme é indicativo de penetração até a transição da derme papilar-reticular. Um frosting amarelo-acinzentado indica penetração na derme reticular 8 . Alémdo tratamento tópico, foramrecomendadas ao paciente as medidas comportamentais de elevação de membros inferiores e o controle glicêmico. No primeiro mês de tratamento, foram realizadas aplicações diárias durante a internação hospitalar, totalizando 30 aplicações de ATA com melhora expressiva do tecido de granulação (Fig. 3). Após a alta, o paciente foi acompanhado semanalmente por mais nove meses, totalizando 36 aplicações ambulatoriais (Fig. 4). Além disso, foram realizadas quatro aplicações de triancinolona (20mg/ml) sendo utilizado 1 a 2ml nas bordas hipertróficas em cada aplicação trimestral. Fig. 4 - Medição da úlcera no sétimo mês de tratamento: úlcera em acompanhamento semanal com a aplicação de TCA a 90% no leito da úlcera. Em domicílio, o paciente realizava troca de curativo com lavagem com soro fisiológico 0,9% e gaze estéril, sem aplicação de cremes ou pomadas. Observamos nesse período melhora gradativa do sintoma de dor crônica, permitindo redução gradual do uso de analgésicos. Além disso, observamos a melhora dos sinais clínicos com aplainamento das bordas hipertróficas, redução da fibrina, surgimento de tecido de granulação com ilhotas de reepitlização que passarama confluir com as bordas da úlcera, aproximando-as durante

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