Na Mídia - Sintomas de um problema crônico
O Globo / Barra
02/08/2018
Hospitais Cardoso Fontes, em Jacarepaguá, e Lourenço Jorge, na Barra, operam com emergências lotadas; faltam pessoal e equipamentos para dar conta da demanda
A crise financeira na saúde pública continua a golpear as
unidades emergenciais da Barra e de Jacarepaguá. Os hospitais Cardoso Fontes e
Lourenço Jorge, os mais importantes da AP-4, que abrange os bairros da Barra da
Tijuca, Recreio, Jacarepaguá e Vargens, estão em estado crítico: faltam médicos
e insumos, as emergências estão superlotadas e quem precisa fazer exames ou
cirurgias fica sem atendimento ou enfrenta longa espera.
No Hospital Federal Cardoso Fontes, uma vistoria do Conselho Regional de Medicina do Rio de Janeiro
(Cremerj), no início de junho, encontrou 24 leitos bloqueados e
muitos pacientes internados nos corredores. A falta de médicos suspendeu
endoscopias de alta complexidade e cirurgias de catarata, afirmam servidores. A
oftalmologia foi paralisada.
Presidente do corpo clínico, o endocrinologista Flávio
Moutinho afirma que, com a equipe reduzida desde o início do ano, os pacientes
tiveram 200 horas a menos de plantonistas em cirurgia-geral e uma redução de
160 horas no atendimento clínico.
— Os serviços realizados pela enfermaria e pelas clínicas
médicas são as melhores formas de drenagem da emergência e do CTI. A
superlotação acontece exatamente quando esse serviço está escasso, já que os
leitos precisam ser fechados por falta de médicos e enfermeiros — explica
Moutinho.
Desde janeiro de 2017 o Hospital Cardoso Fontes enfrenta
problemas de pessoal. Na época, 40% da força de trabalho eram de funcionários
temporários, sendo o restante preenchido majoritariamente por servidores
concursados e uma pequena parcela por servidores cedidos pela prefeitura e pelo
Corpo de Bombeiros. O fim da renovação dos contratos, aliada à aposentaria de
parte dos servidores federais, fez a direção da unidade afirmar que
necessitaria contratar 400 novos profissionais de saúde, entre médicos,
enfermeiros e técnicos de enfermagem, para funcionar plenamente.
Moutinho era o vice-diretor do hospital na época, e diz que
as baixas se deram principalmente no setor de enfermagem, mas também afetaram
cirurgiões e fisioterapeutas.
—Ao longo desse tempo, perdemos quase 50 pessoas. As
renovações de contrato voltaram a acontecer em abril deste ano, mas não há
novos funcionários chegando —salienta.
Os reflexos podem ser observados sem muita dificuldade.
Quando a equipe do GLOBO-Barra foi ao local, uma placa na emergência informava
que, devido à superlotação, desde o último dia 10 a garantia de atendimento é
dada “somente aos pacientes com risco de morte”.
Hélio Romão, de 64 anos, ficou na fila durante duas horas
até ser atendido pelo único médico de plantão. Ele sofreu uma infecção urinária
devido a um antigo problema na bexiga.
— O hospital está sem urologista. Preciso fazer exames para
conseguir marcar uma cirurgia, mas, toda vez que ligo, ouço que não tem médico.
Venho à emergência com a esperança de conseguir algum atendimento — reclama
Romão.
Outra especialidade que enfrenta problemas é a oncologia,
que parou de receber novos pacientes diretamente, devido à superlotação. De
acordo com o Cremerj, porém, pacientes com câncer dão entrada no hospital por
outras especialidades, como ginecologia e dermatologia, ou pela própria
emergência, e são encaminhados ao setor oncológico, o que sobrecarrega ainda mais
o serviço.
O presidente do Cremerj,
Nelson Nahon, frisa que a diminuição da equipe impacta diretamente no serviço
oferecido aos pacientes.
— Em um ano o Cardoso Fontes perdeu quatro oncologistas e
um reumatologista. Vamos pegar essa vistoria e a que fizemos no Hospital Geral
de Bonsucesso e apresentá-las novamente à Defensoria Pública da União para
cobrar que seja cumprida a decisão do Ministério Público que determina a
contratação de novos funcionários e a abertura de concurso público —explica.
A direção do Hospital Cardoso Fontes afirma que 452
profissionais serão contratados até o final de agosto, o que representa um
aumento de 25% no quadro atual de 1.782 trabalhadores. Em relação ao setor de
oftalmologia, o hospital argumenta que o atendimento está concentrado nos
hospitais da Lagoa e dos Servidores do Estado, referências no Sistema Único de
Saúde.